Henrique Meirelles: ‘O Brasil não é diferente’

Em artigo, ex-presidente do BC defende o regime de metas. "Da mesma maneira que para controlar o peso é preciso regular a alimentação e fazer exercício, para controlar a inflação o BC precisa usar os juros".

22/06/2015

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Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central e colaborador do Espaço Democrático

Com a inflação e a taxa de juros elevadas, ganha força a visão de que os juros não funcionam contra a inflação no Brasil. Soa mais como aquela velha versão de que no Brasil é diferente ou de que “não existe pecado ao sul do Equador”.

Primeiro, a experiência mostra que o Brasil não é diferente e que os canais de transmissão da política monetária funcionam normalmente no país. Segundo, remetendo à célebre frase de Churchill, a experiência internacional mostra que o regime de metas de inflação é o pior regime, à exceção de todos os outros.

Da Idade Média à Era Moderna, o ouro prevaleceu como moeda de troca justamente por ter oferta limitada, o que inibia a inflação. Quando os governos começaram a imprimir moeda, descobriram o que parecia uma forma mágica de expandir gastos – imprimir mais dinheiro.

O Brasil teve sua primeira experiência desse tipo no final do século 19. Um advogado brilhante, Rui Barbosa, quando ministro da Fazenda promoveu alta inflação ao imprimir dinheiro para financiar os gastos públicos da nova República, que já nasceu mergulhada na inflação e no abuso monetário. As consequências foram drásticas, com desorganização econômica, crise financeira e ajustes subsequentes.

Episódios de hiperinflação no mundo levaram ao teste de diversos sistemas para controlar a inflação – dos mais primários, como o controle de preços, passando pelo regime monetarista, que buscava limitar o dinheiro em circulação, e chegando ao regime de metas. Neste último, adotado em praticamente todas as economias relevantes, passou-se a fixar meta para a inflação e usar a taxa de juros como principal instrumento para controlá-la.

Uma crítica comum ao regime de metas é o fato de que uma queda na oferta de alimentos após seca, por exemplo, gera aumento de preços que não são afetados pelos juros. Isso, no entanto, é resolvido por diversos mecanismos. Nos EUA, itens como alimentação e energia são excluídos do cálculo. No Brasil, optou-se por uma meta de inflação incluindo todos os itens, mas com intervalo de tolerância para acomodar os choques de oferta. O intervalo de tolerância, no entanto, deve ser usado apenas para acomodar choques temporários de oferta, e por períodos curtos.

Outra crítica é que o risco nos EUA e na Europa agora é a deflação, o que mostraria que o sistema está ultrapassado. Mas o problema do Brasil é a inflação. E o BC americano já avisou que a economia está saindo da crise, o risco de inflação está voltando e os juros subirão.

Em resumo, da mesma maneira que para controlar o peso não há solução indolor, sendo preciso regular a alimentação e fazer exercício, para controlar a inflação o Banco Central precisa usar os juros.

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