Reforma política não é remédio para tudo, mas ajuda

No terceiro Encontro Democrático, especialistas discutem a reforma política e concluem: não haverá grandes mudanças, mas é possível aperfeiçoar o sistema atual.

22/04/2015

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Rubens Figueiredo, Thiago Boverio e Rogério Schmitt

Tema recorrente no cenário nacional há mais de 30 anos, a reforma política é com frequência vista como uma solução quase mágica para problemas como crises institucionais ou falta de credibilidade do governo e dos partidos. Cientistas políticos e um especialista em legislação partidária reunidos pelo Espaço Democrático, porém, têm visão mais realista sobre a questão. Para eles, a reforma política não é uma panaceia e não teria o poder de resolver dificuldades como as enfrentadas pelo Brasil atualmente. Mas acreditam que mudanças pontuais podem ajudar, aperfeiçoando o sistema político e fortalecendo o poder legislativo, ao mesmo tempo em que aproximaria os partidos dos eleitores, resgatando sua credibilidade.

Clique aqui para ler a íntegra do encontro

Rubens Figueiredo e Rogério Schmitt, cientistas políticos e consultores do Espaço Democrático – a fundação do PSD para estudos e formação política –, e Thiago Bovério, advogado especializado em legislação partidária, foram os participantes do terceiro Encontro Democrático, nova série de painéis realizada para debater temas de interesse da sociedade brasileira. Nos dois primeiros encontros, os temas foram o ânimo empreendedor dos brasileiros e a inclusão das bicicletas no sistema viário das grandes cidades.

 

Também conduzido pelo jornalista Sérgio Rondino, o terceiro encontro foi aberto por Rubens Figueiredo, para quem é mais interessante fazer um aperfeiçoamento contínuo do que promover uma reforma política. “Normalmente se discute a reforma política como um conjunto de medidas que daria o aperfeiçoamento institucional muito rápido. Por isso eu costumo brincar que no Brasil se defende uma reforma revolucionária que não aconteceu em nenhum lugar do mundo. Acho mais viável buscar aumentar a estabilidade do regime, a efetividade decisória, o cumprimento dos mandatos com honestidade e transparência e aumentar também a adesão dos cidadãos aos valores democráticos”, afirma Figueiredo. Para ele, “a reforma do jeito que se imagina no Brasil é muito difícil de acontecer pelas paixões que desperta. Ela teria um caráter paralisante no Congresso Nacional. Em vez de ajudar, atrapalharia a votação de propostas e questões mais importantes”.

Campanha mais barata

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O advogado Thiago Bovério

Por sua vez, o advogado Thiago Bovério entende que o foco deve ser o aperfeiçoamento da legislação que já existe, e de forma moderada. “Nada muito radical, nada exagerado. E passo a passo. A gente ouve falar muito hoje da questão do excesso de gastos na campanha. É desejo de todos combater esse enorme volume de dinheiro que é gasto nas eleições. Eu começaria por aí”, diz ele.

Em sua opinião, esse objetivo poderia ser atingido adotando-se mecanismos de aperfeiçoamento para baratear as campanhas. Depois, num segundo passo, o fortalecimento dos partidos. “E tudo isso através de legislações que se amoldam à cultura do País. Muito se fala também em coincidência das eleições, escolha para todos os cargos no mesmo ano. Eu acredito que os eleitores do nosso País não estão preparados ainda. Isso causa confusão. Essa reforma também tem que levar em conta a cultura, a maturidade da nossa sociedade”, explica.

Já Rogério Schmitt acredita que existem certas características institucionais do nosso sistema político que já se provaram duradouras. “E qualquer reforma política, para dar certo, precisa partir de uma premissa: certas coisas não vão mudar. Que o Brasil é uma democracia, em primeiro lugar. Um regime republicano, federativo, presidencialista, multipartidário, com sistema de voto proporcional”.

Schmitt lembra que essas são instituições que, embora sejam objeto de polêmica, resistiram bem à prova do tempo. “O debate da reforma política não pode ser feito na base de comparações com o que existe em outros países. Não é assim que se debate. Precisamos intervir pontualmente para aperfeiçoar as instituições que já temos e não para trocá-las por outras inteiramente novas. Nenhum político, no mundo inteiro, jogaria racionalmente fora as instituições pelas quais foram eleitos para colocar no lugar delas outras que não saberiam como funcionariam na prática. Essa tem que ser a premissa básica: buscar aperfeiçoar o que já existe”, afirma.

Cláusula de desempenho

Nesse sentido, concordaram os participantes do debate, é necessário definir prioridades e buscar o consenso em dois ou três pontos que tragam de fato avanços para a atividade política. “Eu diria que pode haver certo consenso com a proposta de uma cláusula de desempenho. Acho que os grandes partidos podem se acordar em relação a isso. É algo que certamente promove o aperfeiçoamento e não é tão difícil de fazer. E o fim das coligações nas eleições proporcionais, que é algo que cria na opinião pública uma sensação de bagunça, de confusão que não ajuda a sedimentar os valores democráticos”, diz Rubens Figueiredo.

Para Thiago Bovério, seria importante investir na criação de mecanismos de aproximação do cidadão/eleitor com o poder público, “principalmente quando a questão envolve eleições”. Em sua opinião, as recentes manifestações de rua indicam que o povo quer participar mais. “Só que há um distanciamento muito grande da legislação hoje, que inviabiliza essa participação mais efetiva do eleitor, do cidadão com o poder, na vida partidária, na vida política do País. Um País muito grande como o nosso, população imensa, teria que facilitar o ingresso na vida partidária”.

Rogério Schmitt, contudo, diz duvidar do clamor popular por mudanças. “Pesquisas de opinião pública mostram que há uma rejeição maior aos partidos políticos, mas a opinião pública é volátil”, diz ele, lembrando que, se for observada a tendência histórica, não é possível perceber aumentos das abstenções eleitorais ou dos votos nulos ou em branco, que poderiam ser sinais de rejeição ao sistema vigente. “Pelo contrário, os dados mostram que, especialmente depois da adoção da urna eletrônica, os votos brancos e nulos atingem patamares baixíssimos, podendo subir um pouquinho ou diminuir, dependendo de cada eleição”, diz.

Fim das coligações

O cientista político Rogério Schmitt

O cientista político Rogério Schmitt

Para ele, a proposta que parece reunir maior consenso atualmente é o fim das coligações nas eleições proporcionais. “Ou seja, os partidos continuariam fazendo coligações nas eleições para presidente, governador, prefeito, senador, mas não seria mais possível fazer coligações nas eleições para deputado federal, estadual e vereador. Essa Proposta de Emenda Constitucional acabou de ser aprovada no Senado, em dois turnos, e provavelmente será votada na Câmara nos próximos meses. Imagino que já valerá para eleição municipal do ano que vem. Não existem muitos outros itens da cesta da reforma política que desfrutem de tanto consenso assim”, afirma Schmitt.

O advogado Thiago Bovério acredita que o fim das coligações proporcionais trará benefícios importantes. “Para o eleitor fica mais fácil identificar a melhor proposta para ele, para o que ele quer, para o que ele pensa. O partido teria que ter um discurso. Ficariam mais evidentes a ideologia, as propostas do partido, e isso seria positivo do ponto de vista do eleitor, aumentando seu conhecimento sobre os partidos e a participação por meio do voto”, explica.

O cientista político Rogério Schmitt afirma que a vantagem mais interessante do fim das coligações proporcionais é a redução no número de partidos que elegem deputados. “Na última eleição, em 2014, foram 28 partidos que elegeram deputados. Se as coligações proporcionais já estivessem proibidas, o número de partidos que elegeriam deputados estaria por volta de oito ou nove, dependendo da eleição. Ou seja, o fim das coligações já é um instrumento equivalente à cláusula de barreira. Ela reduz muito a fragmentação partidária”, explica.

Para Rubens Figueiredo, o efeito pedagógico mais interessante seria dar clareza ao quadro partidário, “fazer com que o eleitor entenda que aquelas forças que estão com suas agremiações registradas e funcionando são as que, de alguma maneira, representam ideias que podem ser explicitadas sem a confusão que existe hoje, com 28 partidos políticos”.

Outro aspecto positivo, para Thiago Bovério, é o barateamento das campanhas. “Diminuindo o número de partidos, de candidatos, o período eleitoral e o tempo de campanha tendem a diminuir. E hoje uma das coisas que se discute na reforma política: diminuição do período de campanha, porque três meses de propaganda custam muito caro”, conclui.

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