Encontro Democrático

Vácuo de certezas é origem dos conflitos entre civilizações

Os atentados e disputas entre culturas que geram tanta ansiedade no mundo atual foram tema de palestra no Encontro Democrático desta quinta-feira

24/03/2017

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Casarões: “A partir da crise de 2008, estamos vendo uma rachadura cada vez mais profunda entre integrantes da mesma civilização”

 

O atual cenário mundial, em que atentados e conflitos culturais impactam o dia a dia de todos, gerando insegurança e ansiedade, se deve ao “vácuo de certezas” que se seguiu ao fim da Guerra Fria. A opinião é do cientista social Guilherme Casarões, o palestrante do Encontro Democrático desta quinta-feira (23), no qual o tema debatido foi o “Choque de Civilizações”.

Para Casarões, a Guerra Fria – período entre o início da década de 1950 e o final dos anos 1980 em que o poder de ditar as regras para o mundo era disputado entre os Estados Unidos e a União Soviética – dava a todos o conforto psicológico de que bastava escolher um lado para se estar protegido. “Com o fim dessa situação, após a derrocada da URSS, foi aberto o espaço para conflitos regionais, tribais e culturais, agravados ainda pelas diferenças entre perdedores e ganhadores do processo de globalização”, lembrou o palestrante, que é professor de Relações Internacionais na ESPM e na EAESP/FGV e foi visiting fellow na Tel Aviv University e na Brandeis University.


Com publicações acadêmicas nas áreas de política externa brasileira, governança global e relações Brasil-Oriente Médio, Casarões foi o convidado desta edição dos Encontros Democráticos, que vem sendo realizados pelo Espaço Democrático – fundação do PSD para estudos e formação política – há dois anos. O objetivo é debater temas de interesse da sociedade, com impacto direto na atuação daqueles que estão ou pretendem entrar na vida pública. O propósito final é produzir conhecimento por meio da divulgação de boas práticas de gestão. As palestras e debates são publicadas na íntegra no site do Espaço Democrático.

 

“Haverá no futuro uma estrutura estável, talvez semelhante à que havia no período da Guerra Fria”, explicou o professor.

 

Guilherme Casarões lembrou que o tema do debate desta quinta foi tratado, por exemplo, pelo cientista político Samuel P. Huntington, que revolucionou o entendimento sobre as relações internacionais com seu best-seller “Choque de Civilizações e Reconstrução da Ordem Mundial”, lançado em 1996. “Sua tese é a de que, diante do fim da Guerra Fria, os conflitos globais deixariam de se orientar por ideologia ou economia e passariam a ocorrer ao longo de clivagens culturais e religiosas. Ainda que polêmico, o argumento de Huntington orientou muitas análises e decisões nas últimas duas décadas”, afirma o palestrante.

Casarões acredita, porém, que a situação foi além do embate entre civilizações – cujos símbolos são o atentado às torres gêmeas de Nova York, em setembro de 2001, e a posterior invasão do Iraque – passando a ocorrer também no interior das próprias civilizações, sejam elas a ocidental, a muçulmana, a asiática ou outra qualquer. “A partir da crise de 2008, estamos vendo uma rachadura cada vez mais profunda entre integrantes da mesma civilização, como mostraram, por exemplo, as manifestações da Primavera Árabe e a atual onda de populismo que se observa nos Estados Unidos, na Europa e em outras regiões”, explicou.

Comparando a situação atual à que ocorreu nas décadas de 1920 e 1930, entre as duas guerras mundiais, o palestrante mostrou preocupação com o futuro. “Nas crises, as máscaras caem, levando embora as expectativas e as esperanças e induzindo as pessoas a buscar conforto psicológico no nacionalismo e até na violência”, afirmou.

Para ele, esse é o resultado de um contexto de grande transição de poder. “A impressão que se tem é a de que o mundo não tem jeito e que a maior possibilidade é a de evolução para um cenário ainda pior. Mas acredito que é uma questão de tempo, pois as transições de poder são, como o próprio nome diz, transitórias e haverá no futuro uma estrutura estável, talvez semelhante à que havia no período da Guerra Fria”, disse, lembrando também que o capitalismo pode se reinventar, rearranjando a situação entre perdedores e ganhadores da globalização.

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