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A reeleição enfraqueceu a democracia

Para Vilmar Rocha, 25 anos foram suficientes para mostrar que, no Brasil, a possibilidade de se manter no poder piorou o País

02/03/2023

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Vilmar Rocha, professor da Faculdade de Direito da UFG, coordenador nacional de Relações Institucionais do Espaço Democrático e presidente do PSD em Goiás

Edição: Scriptum

 

Como é natural em uma democracia em formação, o Brasil tentou fazer um aperfeiçoamento no sistema eleitoral ao aprovar a reeleição, em 1997. Foi um erro político não previsível, mas preponderante para que o País se polarizasse em duas tendências de conteúdos pasteurizados. Para pacificar o País e criar alternativas de poder para além dos extremos, é preciso acabar com o instituto da reeleição.

Já pensei diferente, inclusive fui um entusiasta da reeleição e votei favorável a ela na Câmara Federal, acreditando na continuidade do projeto de Estado que nascia ancorado pelo Plano Real.

No Brasil, as instituições republicanas e democráticas foram inspiradas e até copiadas das norte-americanas – federalismo, presidencialismo, divisão e competência dos poderes e os princípios centrais do Estado de Direito Democrático. Mas diferentemente dos Estados Unidos, nosso presidencialismo não previa a reeleição.

Desde a nossa primeira Constituição Republicana, de 1891, adotamos a troca de governante a cada mandato – de quatro ou cinco anos – e apenas Getúlio Vargas, como ditador, havia ocupado a presidência da República por 15 anos, de 1930 e 1945.

Os 25 anos de reeleição foram suficientes para mostrar que, no Brasil, a possibilidade de se manter no poder piorou o País. Em todas as três oportunidades em que o presidente da República foi reeleito, o segundo mandato foi pior do que o primeiro e até ensejou impeachment. Situação que se reproduziu nos Estados e municípios.

A mudança alterou a dinâmica governamental não no sentido que se esperava quando foi proposta, que era dar tempo ao governante para que ele colocasse seu projeto de governo em prática. Frente à possibilidade de um segundo mandato, assistimos a governantes abandonando o projeto que os elegeu ainda no primeiro mandato para perseguir a reeleição.

Há uma distorção daquele ideal que nos motivou a adotar a reeleição, contrariando nossa própria tradição de alternância de poder a cada eleição. A democracia foi empobrecendo à medida que o centro político, tendência majoritária do brasileiro, foi cedendo espaço aos apelos dos segmentos polarizados. A escolha eleitoral passou a se dar pela negação de um dos polos, não mais pela representatividade dos candidatos.

Considero este um dos efeitos mais danosos da reeleição e acredito que o fim dela vá promover uma distensão política definitiva, com o rompimento desse modelo polarizado em Lula e Bolsonaro, e uma consequente pacificação do País.

Tenho convicção de que uma mudança constitucional que revogue a reeleição encontraria ambiente favorável no Congresso Nacional, onde há uma representação parlamentar de centro significativa, capaz de conduzir essa pauta importante e urgente.

É preciso espírito republicano para admitir que acabar com a reeleição é um passo importantes para pacificar o país e para que, a partir daí, possamos avançar com base em um projeto de Estado, e não de poder.

 

Artigo publicado no Blog do Fausto Macedo, no Estadão, em 1 de março de 2023

 

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