PSD MULHER

Vereadora combate violência doméstica no sertão da Bahia

Marília Zotareli enfrenta o machismo e luta pelos direitos femininos no município de Antas, que tem cerca de 20 mil habitantes. “O fato de me colocar abertamente a favor de algumas pautas acabou fortalecendo as mulheres aqui”

07/10/2021

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Marília tem especialização em Pediatria e começou o projeto na Santa Casa de Misericórdia

 

A coragem para enfrentar o machismo e o coronelismo marca a trajetória da vereadora Marília Zotareli (PSD), que se tornou referência na defesa dos direitos das mulheres no município de Antas, localizado no sertão da Bahia, a cerca de 350 quilômetros da capital do Estado, Salvador. Única representante feminina e da oposição entre os 11 vereadores que compõem o Legislativo local, a parlamentar é reconhecida por sua atuação contra a violência doméstica na cidade, com população estimada pelo IBGE em 20 mil habitantes.

Antes de ingressar na política, quando iniciou o trabalho como médica na Santa Casa de Misericórdia de Antas — hospital que pertence à família do marido da vereadora — Marília criou um sistema de atendimento às pacientes agredidas por seus companheiros. “Os casos de violência começaram a aparecer de forma endêmica, praticamente toda semana tínhamos um. Teve mulher vítima de ‘machadadas’, com parte do rosto queimado ou vítima de armas brancas. Teve marido que chegou da roça, tomou cachaça e ‘picotou’ a enxada na mulher. Esses foram os casos mais sérios. O tapa é uma agressão muito corriqueira aqui, infelizmente”, relembra a vereadora, que tem 35 anos e exerce seu primeiro mandato.

Nascida em Presidente Prudente, município do interior de São Paulo, Marília conta que, no início do projeto, em 2016, teve de enfrentar uma sociedade mais machista que a da sua terra natal. “Era um trabalho visto como uma exposição desnecessária, como se eu estivesse metendo o bedelho onde não deveria. Então, começamos de uma maneira muito discreta, criando uma planilha no Excel com os nomes e endereços dessas mulheres e os prontuários sobre o que acontecia. A gente começou a criar uma rede de apoio.”

Nesse período, a médica percebeu que, em função do machismo, até os pais das vítimas justificavam as atitudes dos agressores. “Me chamou muito a atenção o conformismo da família, havia uma condescendência com o agressor, como se a culpada fosse sempre a mulher. Isso é bizarro e muito preocupante.”

Formada em Medicina pela Universidade do Oeste Paulista (Unoeste), com especialização em Pediatria, Marília passou a realizar palestras sobre violência doméstica em escolas, na Câmara Municipal e no Fórum. Além disso, encaminhava as vítimas para atendimento psicológico e passou a visitar as casas das pacientes. “As visitas eram feitas sem aviso. Conforme ganhamos mais estrutura, conseguimos um advogado pro bono (que prestou o serviço gratuitamente) para os casos em que a mulher concordava em acionar a Justiça. Agora, com um mandato, consegui aproximar as polícias Militar e Civil, que fazem o papel de enquadrar o marido e de chamar ele para uma conversa na delegacia.”

Segundo Marília, que não deixou de atuar como médica do projeto, o distanciamento social adotado durante a pandemia contribuiu para o agravamento da violência doméstica em Antas, assim como ocorreu nos grandes centros urbanos do País. Em 2020, foram registrados dois casos de feminicídio na cidade.

A parlamentar é autora do projeto de lei que propôs a criação da Ronda Maria da Penha no município. Por unanimidade, a proposta foi arquivada na Câmara Municipal, apesar do esforço da vereadora.

Cenário político

Ainda de acordo com Marília, o machismo é tão enraizado no município que muitos homens controlam até as preferências políticas de suas esposas. “Elas não têm liberdade no voto. Quando o marido assume compromisso com algum político, já inclui todas as mulheres da família dele, que têm de acompanhá-lo.”

Por defender suas ideias com convicção e não se intimidar com a postura agressiva dos adversários, Marília tornou-se um exemplo para outras outras mulheres na região. Quarta vereadora mais votada nas eleições de 2020, com 693 votos, ela já pensa em alçar voos mais altos na política local. “Tenho muita avidez por conhecimento e sinto que estou desbravando um território, falo de coisas que não eram faladas. O fato de me colocar abertamente a favor de algumas pautas acabou fortalecendo as mulheres aqui.”

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