10 de out de 2011
· Assembleia Constituinte, PSD, Veja
A proposta de reforma da Constituição que o PSD, partido de Gilberto Kassab, tentará é vista como demagógica por juristas, porém a necessidade de criação de leis que supram lacunas e corrijam falhas no texto constitucional é considerada premente em uma série de questões.
Para o professor de direito constitucional da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo, Dimitri Dimoulis, a intenção do PSD esbarra na realidade mais óbvia. Desde a Constituinte de 1988, os sucessivos governos mantêm a maioria no Congresso, mesmo assim não conseguem promover as alterações necessárias, apelando para Medidas Provisórias (MPs), em uma interminável disputa de poder entre Executivo e Legislativo.
Brechas – Professor de direito constitucional da Universidade de São Paulo (USP) e procurador-geral do Estado de São Paulo, Elival da Silva Ramos lembra que a tentativa de modernização da Carta Magna não é uma novidade. Porém ele duvida que o texto fique conciso algum dia, já que o direito brasileiro é baseado em modelos europeus. “Nossa Constituição pretende ser social-democrata, com mecanismos de intervenção do estado e de políticas públicas. Jamais seremos enxutos como os americanos”, diz.
Em alguns casos, a falta de leis complementares – aquelas que dizem como deve funcionar o que manda a Constituição –, cria lacunas que acabam por prejudicar diretamente a vida dos brasileiros. O direito de greve do funcionalismo, que por não ser regulado deixa brecha para que serviços públicos essenciais à população deixem de funcionar é um deles. Outro exemplo é a criação de municípios. Há situações em que o prefeito e vereadores são eleitos e a cidade funciona, porém o caso ainda está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). “Não temos só a falta de leis, mas leis antigas e malfeitas”, afirma Dimoulis, citando o Código Tributário, cuja reforma não sai da intenção e do discurso.
Dimoulis lembra que há situações bem mais graves, ainda que distantes do cotidiano do cidadão comum, como a ausência de uma norma que defina o que é terrorismo e como os envolvidos nesse tipo de crime devem ser tratados. “A Constituição diz que é preciso, mas não definimos nada”, diz. Por causa disso, a Polícia Federal não consegue tirar de circulação os extremistas islâmicos que se valem de uma rede de simpatizantes para entrar e sair incólumes do Brasil.
Supremo – A Justiça é afetada até em seu funcionamento interno. A disputa entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para definir se juízes podem ser investigados fora do âmbito de seus tribunais foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). A AMB diz o trabalho do CNJ é inconstitucional. Culpa do texto da lei que reformou o Judiciário em 2004, que deixou margem para dúvidas.
O jurista Oscar Vilhena Vieira, da FGV-SP, explica que a falta de definições mais precisas na Constituição não é errada, já que o objetivo da mesma é servir como um guia de princípios. O real problema está, sim, na falta de ação dos legisladores que vieram depois de 1988. “Ora por incompetência, ora por ato político, eles deixaram de agir”, diz. Como resultado direto, o STF foi obrigado a agir em casos que há tempos exigiam uma solução, como nas uniões homoafetivas. “Quando o Legislativo fizer sua parte, o Supremo sairá de campo”.
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