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‘Há insatisfação clara dos senadores com o governo’

Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o líder do PSD no Senado, Otto Alencar (BA), diz que parlamentares reclamam de falta de atenção

10 de jun de 2024 · Congresso, Lula, Otto Alencar, Senado

Agência Senado

Otto Alencar: “Muitos senadores não têm acesso aos ministros, nem retorno das ligações”

Edição Scriptum com Valor Econômico

O líder do PSD no Senado, o senador Otto Alencar (BA), apontou em entrevista ao jornal Valor Econômico, publicada na sexta-feira (7), dificuldades no relacionamento entre a Casa e a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele afirma que existe uma “insatisfação clara” por parte de parlamentares da base aliada. “É duro falar isso, mas muitos senadores não têm nem acesso aos ministros, nem retorno das ligações”, disse Alencar.  “Alguns senadores dizem: ‘Otto, eu sou ninguém para o governo. Eles acham que eu não existo’. A desatenção tem sido muito grande”, contou.

Segundo Alencar, ministros indicados por siglas do Centrão, antes adversários de Lula, têm privilegiado apenas aliados. “É preciso que os ministros com autonomia resolvam os problemas de deputados e senadores, para que o problema não tenha que chegar no presidente da República. Mas não está acontecendo isso. E não sei se o núcleo duro do governo está passando isso para o presidente”, declarou.

O senador baiano chegou a sugerir há três meses que Lula chamasse os parlamentares para conversas presenciais, mas isso não ocorreu até o momento. “Sem isso, fica difícil”, avaliou.

Ainda de acordo com ele, na votação do projeto de lei que fixa em 20% a taxação sobre compras internacionais de até US$ 50, a bancada do PSD só entregaria sete votos entre os 14 integrantes do grupo – sem considerar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Cotado como um potencial candidato na disputa à sucessão de Pacheco, Alencar não descarta a possibilidade, mas diz que o tema só deverá ser discutido após as eleições municipais.

A seguir os principais pontos da entrevista ao Valor:

Valor: Como avalia a articulação política do governo junto ao Congresso? Vê dificuldades?

Otto Alencar: No ano passado, o governo foi muito vitorioso. Este ano, por outro lado, perdeu nos vetos que tinha interesse [como o da saidinha, na última sessão do Congresso]. Além disso, aprovou o PL de recriação do DPVAT com 41 votos [número mínimo]. Por quê? Porque alguns senadores da oposição foram convencidos a votar a favor por mim e pelo [Jaques] Wagner. Não foram senadores que estão no governo. Depois disso, todas as matérias que têm sido levadas ao plenário enfrentam dificuldade, inclusive a questão da taxação das compras internacionais. Se fosse para fazer deliberação nominal, o governo perderia por muitos votos. Havia a ausência de muitos governistas, inclusive do PSD. Existe uma insatisfação clara dos senadores com o governo. Está mais do que claro. As queixas vêm até mesmo do PT.

Por qual razão?

É de uma maneira geral. É duro eu falar isso, como líder de partido, aliado do governo, mas muitos senadores não têm acesso aos ministros, nem retorno das ligações. É impossível você falar, por exemplo, com o presidente do Ibama e ele retornar ou atender. Ninguém está atrás de coisas que seriam impossíveis, isso é fluxo de governo. Realmente existe uma dificuldade muito grande. Nos esforçamos, por exemplo, para rejeitar o projeto [que dificulta a cobrança] do imposto sindical na CCJ, na quarta-feira (5), e perdemos por 16 votos a nove. Era interesse do governo. Alguns senadores aqui da base falam: “Otto, eu não sou ninguém para o governo, eu não sou ninguém. Eu sou senador da República.”

O senhor já falou sobre isso com Lula?

Quando eu estive com o presidente Lula, no último jantar no Palácio da Alvorada, eu disse que era preciso entrar na articulação, abrir a agenda dele para receber senadores pessoalmente. E isso não aconteceu. Eu já cobrei isso do líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), do ministro Alexandre Padilha, mas não tem acontecido. Tem senadores aqui que nunca estiveram com o Lula, são vários, do meu partido, inclusive. Eu sou da causa, acredito no presidente, trabalho intensamente e tenho firmeza de que o projeto vai dar certo e vai ser bom para o Brasil. Mas dentro do PSD eu já não conto com o voto de muitos senadores.

Resumindo, é uma questão de falta de atenção?

Sim. Fica claro que o presidente, para fazer maioria, mais na Câmara, teve que compor com grupos que não o apoiaram… Todo presidente da República faz esse tipo de aliança. Mas, é preciso que os ministros com autonomia para resolver os problemas de muitos deputados e senadores os resolvam, para que o problema não tenha que chegar no presidente da República. Mas não está acontecendo isso. E não sei se o presidente está tendo conhecimento disso. Me parece que o núcleo duro do governo não está passando isso para ele. Quando estive com Lula, eu disse: “Presidente, facilite a minha vida de líder, atenda os senadores”. Sem isso, fica difícil.

Quais foram as dificuldades em busca dos votos para o PL que taxa em 20% compras internacionais de até US$ 50?

Eu liguei para alguns do PSD que falaram que não iriam votar. Ontem [quarta-feira], se tivesse voto nominal, eu só teria sete votos, dos 14 que votam. É metade.

Considera que será necessária uma reforma ministerial?

Quando você é ministro de Estado, você é ministro de todos que compõem a base, não é ministro de partido. Não é porque o [Alexandre] Silveira está no ministério [de Minas e Energia] do PSD que ele tem que atender só o PSD. Não existe ministro de partido, de dizer “eu vou atender o fulano de tal”. Não é assim. E isso de alguma forma tem dificultado algumas coisas que estão acontecendo para atender a quem indicou. Não é assim, você é ministro de Estado, deve atender a todos igualmente.

Quais são os ministros?

Prefiro não falar.

Qual seria o melhor timing para fazer eventuais ajustes?

Isso tem tempo para ajustar porque este ano é ano eleitoral. Vai ter que ver como que sai das urnas, sobretudo nos grandes centros urbanos, não só nas capitais. O que sai das urnas é o exame exato do que está acontecendo na política. É quase que uma ressonância magnética do quadro eleitoral.

Essa situação da articulação pode prejudicar o governo novamente em próximas votações?

Tradicionalmente, em ano eleitoral, o presidente e os governadores esperam o resultado para saber quem saiu forte e quem saiu fraco. Depois é que avançam os principais projetos na ponta. O governo internamente fez praticamente tudo, falta só regulamentar a reforma tributária, que eu não acredito… Este semestre já foi, no segundo, com as eleições, vai ser difícil.

A regulamentação da tributária deve ficar para 2025?

Acho que sim.

O que o senhor vê de mais importante que pode ir a votação ainda neste ano?

Está tramitando aqui o projeto do hidrogênio verde, do qual eu sou relator, e que deve ser aprovado em breve. Outra matéria de interesse do governo, da qual também sou relator, é a de seguros e resseguros, que precisa ser apreciada. Tenho conversado com o ministro Fernando Haddad [Fazenda] sobre isso, afinamos o relatório juntos.

Muitos acreditam que a eleição à sucessão do presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) já está resolvida com a pré-candidatura de Davi Alcolumbre (União-AP). Por outro lado, o nome do senhor também é apontado como o de possível candidato. Como vê esse cenário?

Pela minha experiência, esse assunto deve ser tratado depois das eleições municipais. A sucessão da Casa Legislativa começa três meses antes. Eu vou reunir o partido e o presidente Rodrigo Pacheco também tem que ser ouvido. Em qualquer Casa Legislativa, o comandante da sucessão é o próprio presidente, conversando com diversos partidos. Eu ainda não ouvi do presidente Pacheco a preferência pelo nome do Davi, do meu ou de um outro senador. Depois das eleições é que nós vamos discutir. Pela relação que tenho aqui no Senado, meu nome é sempre lembrado por muitos dos meus colegas, mas eu vou deixar isso para depois. Se eu vier a assumir, vai ser dentro de um padrão em que todos possam participar da Mesa Diretora, até mesmo a oposição.

A disputa no Senado parece ter se antecipado e muitos consideram que Pacheco já estaria comprometido com Alcolumbre…

Sendo do nosso partido, Pacheco teria e terá que discutir com o nosso partido. Ele não pode desconhecer que é do PSD. O primeiro a apoiá-lo [à presidência] fui eu. O PSD tem crédito com ele, como tem o Davi. Se houver uma composição, ótimo. Se houver um embate, tem que ser dentro de um padrão ético.

Há relação entre a próxima disputa no Senado e na Câmara? As negociações ocorrerão de forma conjunta?

Não vejo essa relação, não. Não é só partido que faz o político, o político também se faz dentro do partido e fora.

O embate com a Câmara sobre a instalação das comissões mistas continua...

Eles não aceitam a lei. Está na lei. As medidas provisórias são analisadas por comissão mista, com proporcionalidade. Lamentavelmente, essa é uma crítica que eu fiz lá atrás ao presidente da Câmara, ele não está aceitando isso. É um descumprimento da legislação. Se quisessem mudar a composição das comissões, teriam que mudar a lei. Então, enquanto não muda a lei, descumpre-se a lei? Está errado. Só haveria saída pela via jurídica, para o STF mandar cumprir a lei… Mas, o presidente Pacheco optou por não tensionar, em um momento que já é de tensão, uma sequela da eleição de 2022. O momento não é próprio de estimular radicalismos. Se a solução não vier com o entendimento, não virá com os exaltados.

Tem receio do aumento do conservadorismo e de pautas de confronto ao STF no Senado?

Não existe a menor possibilidade de o Senado fazer impeachment de ministro do Supremo porque todos os requerimentos que foram encaminhados aqui, eu li todos, não têm fato determinado. O que há aqui é que os ministros do STF têm tomado decisões que de alguma forma vêm de encontro a interesses políticos. A única crítica que eu tenho ao STF é à publicidade que tem sido dada a votos pela TV Justiça. Deu um caráter político. Eu fui conselheiro do Tribunal de Contas e nunca dei entrevista. O juiz fala nos autos.

A PEC que fixa mandato para ministros pode avançar?

Sou contra, no meu conceito individual, sem falar pelo PSD. Acho difícil passar aqui.

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