Segundo Pacheco, as palestras do seminário têm o objetivo de debater os riscos e as oportunidades do uso da tecnologia para o “presente e futuro da democracia”
Edição Scriptum com Agência Senado
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), abriu na segunda-feira (25) o seminário internacional “Democracia e Novas Tecnologias: desafios da era digital”, promovido pelo Senado, como parte das comemorações dos 200 anos da Casa, que vai até a quarta-feira (27). Com transmissão pelo YouTube da TV Senado, o evento teve aula magna do sociólogo espanhol Manuel Castells.
Para o especialista, a utilização das redes sociais por pessoas já muito polarizadas pode comprometer o debate democrático racional, levando a um mundo de desinformação, notícias falsas e manipulação de imagens e personagens pela inteligência artificial (IA).
Atentos ao alerta de Castells, os senadores vêm apresentando vários projetos que tratam do uso da inteligência artificial. Um deles foi apresentado pelo senador Rodrigo Pacheco, que tomou por base o anteprojeto apresentado em dezembro de 2022 pela Comissão de Juristas sobre Inteligência Artificial (CTIA). Com base no texto dos juristas, o presidente do Senado apresentou o PL 2.338/2023, que regulamenta o uso de IA.
O texto cria regras para que os sistemas de inteligência sejam disponibilizados no Brasil, estabelecendo os direitos das pessoas afetadas por seu funcionamento. Também define critérios para o uso desses sistemas pelo poder público, prevendo punições para as eventuais violações à lei e atribuindo ao Poder Executivo a prerrogativa de decidir que órgão irá zelar pela fiscalização e regulamentação do setor.
Segundo Pacheco, as palestras do seminário, que serão realizadas de 25 a 27 de março, têm o objetivo de debater os riscos e as oportunidades do uso da tecnologia para o “presente e futuro da democracia”. Ele afirmou que os desafios do advento da tecnologia na sociedade incluem a relação com a radicalização de posições políticas.
“O otimismo inicial de que as novas tecnologias abririam caminho para a democracia direta, para uma participação popular maior e mais efetiva no processo de deliberação nacional para a constituição de uma verdadeira ágora digital, foi substituído pela preocupação com a radicalização de toda a natureza”, avaliou.
Para o presidente do Senado, as divisões se manifestam nas redes sociais, que contribuem para isolar os usuários em “bolhas informacionais” e restringem o diálogo. Como impactos negativos, há a disseminação de desinformação e de discursos de ódio.
Para Rodrigo Pacheco, o desenvolvimento e a popularização das tecnologias de IA têm revolucionado diversas áreas da atividade humana. Ele afirma que “as previsões apontam que a inteligência artificial provocará mudanças econômicas e sociais ainda mais profundas num futuro próximo”.
Segundo o parlamentar do PSD de Minas, as proposições legislativas apresentadas indicam que o Senado reconhece a relevância da questão. Pacheco ainda registra que sua matéria “busca conciliar, na disciplina legal, a proteção de direitos e liberdades fundamentais, a valorização do trabalho e da dignidade da pessoa humana e a inovação tecnológica representada pela IA”.
Manipulações
Em sua palestra, Castells disse que o mau uso da tecnologia se agrava em um momento no qual a humanidade se defronta com grandes problemas. Segundo o professor, o debate público tem se convertido em uma série de manipulações que provocam um efeito negativo da tecnologia sobre a democracia. Castells afirma que as tecnologias podem aumentar a crise da democracia. Ele cita o exemplo das eleições nos Estados Unidos e no Brasil, ocasiões nas quais a polarização e o uso das redes sociais ficaram muito evidentes.
O professor espanhol faz a ressalva de que as tecnologias não são a causa do problema, mas o “amplificam enormemente”. Para Castells, a origem da crise democrática é a falta de confiança nos políticos e nas instituições políticas. Ele aponta a regulação das redes sociais e do uso da inteligência artificial como uma possível saída.
“O problema é que as redes sociais estão controladas por oligopólios e, por conseguinte, teria que se impor por lei a essas empresas essa regulação. Em particular, hoje em dia, o mais importante é começar a regular seriamente a inteligência artificial. A questão aqui é a capacidade que tem a inteligência artificial de criar em nossas mentes um mundo totalmente artificial “, afirmou.
De acordo com Castells, três quartos dos cidadãos não confiam em seus políticos, nem nas instituições políticas democráticas. Ele ainda informa que 77% dos pesquisados são a favor da democracia. No entanto, pondera o professor, as pessoas consideram que “a democracia em que vivem não é democracia”. Assim, como as pessoas já pensam que os políticos não são confiáveis, que a política democrática não é essa em que vivem em seu país, as redes sociais com toda essa desinformação ampliam enormemente a crise de legitimidade e, cada vez mais, pessoas reagem emocionalmente. Não acreditam nem na mídia, nem no que veem nas redes, porque cada um acredita na sua parte do que vê nas redes:
“Acredito que a tecnologia por si mesma não causa efeitos sociais e políticos. É como se utiliza a tecnologia, quem e para quem. Então, o que está ocorrendo é que na medida que os processos políticos se decidem, sobretudo na mente das pessoas, a capacidade tecnológica de fazer com que os processos tecnológicos de comunicação estejam embasados em visões fictícias da realidade, [fica] deformada em função dos interesses políticos e sociais”, afirmou o professor espanhol.