Raimundo Colombo: ‘Uma questão de justiça’

Em artigo, governador de Santa Catarina critica metodologia de cálculo da União para pagamento de dívidas dos governos estaduais. "A saída para evitar o desequilíbrio fiscal não pode ser mudar a legislação e penalizar os Estados", afirma.

25/04/2016

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Raimundo Colombo, governador de Santa Catarina

 

“A mão que afaga é a mesma que apedreja.” O verso do poeta Augusto dos Anjos se aplica perfeitamente ao que vivemos hoje em relação à dívida pública dos Estados.

Em um primeiro momento, o governo federal anunciou uma nova legislação para ajudar os Estados, deixando os gestores confiantes e agradecidos.

O princípio da lei complementar 148, sancionada em 2014, era claro: dar fôlego às finanças dos governos estaduais. Em 2015, entretanto, o mesmo governo federal inverteu as regras com o decreto 8.616, estabelecendo outra metodologia de cálculo para pagamento da dívida. Uma mudança drástica, transformando a legislação que beneficiaria os Estados em uma verdadeira punição.

As contas que fizemos em Santa Catarina não deixam dúvidas. Em 1998, firmamos com a União o contrato de refinanciamento da dívida, R$ 4 bilhões à época. Até o final de 2015, o valor pago já somava R$ 13 bilhões. Com o decreto, que prevê a cobrança de juros compostos (juros sobre juros), nossa dívida aumentará R$ 9,5 bilhões, montante que deixará de ir para investimentos em educação, saúde, segurança e tantas outras áreas.

Aceitar essa alteração no pagamento da dívida sem discuti-la em profundidade seria injusto com todos os catarinenses que pagam impostos. No Supremo Tribunal Federal, já obtivemos liminar favorável que nos permite pagar o valor considerado justo da nossa dívida até o julgamento definitivo do mérito.

É importante salientar que Santa Catarina não cobra juros sobre juros em cima de débitos tributários com o Estado. Somos coerentes.

De forma alguma pregamos qualquer tipo de calote coletivo por parte dos Estados. Prova disso está no fato de que, mesmo antes da decisão favorável do STF, não deixamos de pagar nossas parcelas.

O que fizemos foi depositar as mensalidades em uma conta específica. Não usamos esse dinheiro. Santa Catarina tem a tradição de honrar seus compromissos, mas a discussão sobre a dívida dos
Estados é uma questão de justiça.

Em parecer elaborado a pedido de nosso Estado, Carlos Ayres Britto, ex-ministro do STF, respalda o nosso entendimento de que o artigo terceiro da lei 148 fala em capitalização simples e contraria o decreto 8.616.

“Ora, ao prever como critério de aferição dos descontos do saldo devedor do Estado para com a União um método distinto daquele previsto na lei, o que fez o decreto 8.616/15? Desbordou dos limites tão estritos quanto benfazejos da lei complementar 148/14. Entrou em rota de colisão frontal com o seu conteúdo material e, mais do que isso, com a sua declarada e essencial finalidade: reduzir o nível de endividamento das unidades federadas. Razão pela qual é de ser denunciada a sua invalidade material”, escreveu.

O governo federal tem combatido nossa tese, alegando que existirá um desequilíbrio fiscal nas contas da União. A saída para evitar isso, em nosso entender, não pode ser mudar a legislação e penalizar os Estados.

É preciso ter ainda mais eficiência de gestão, cortar gastos, tomar decisões duras, como a necessária reforma da Previdência.

Em Santa Catarina, temos feito reformas importantes desde 2011, como a da própria Previdência. Assumimos o compromisso de não aumentar impostos. É na gestão que fazemos a diferença.

Estamos, mais uma vez, buscando o diálogo, o bom senso. Apenas alongar a dívida por 20 anos, como propõe o governo federal, é jogar para frente um problema que precisa ser resolvido agora.

 

Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 20 de abril de 2016

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